quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

29 de fevereiro

Como não terei oportunidade, tão cedo, de escrever uma mensagem no dia 29 de fevereiro, fica um breve apontamento sobre a peculiaridade dos anos bissextos.

No dicionário Priberam (recurso online descomplicado), encontra-se a seguinte definição:

bissexto |eis|
(latim bisextus, -a, -um)
adj.
1. Diz-se do ano em que .fevereiro.fevereiro tem 29 dias. = BISSEXTIL
2. Que exerce pouco determinada .atividade.atividade (ex.: poeta bissexto)
s. m.
3. Dia que, cada quatro anos, se junta ao mês de .fevereiro.fevereiro.
Ora, fiquei a saber que quem exerce uma atividade ocasional pode ser adjetivado como bissexto. De repente, não sei bem porquê, ocorrem-me os democratas bissextos que temos tido a infelicidade de ver atuar no (des)governo do país e desta ficção chamada europa...
Um outro apontamento rápido - a sabedoria popular reputa os anos bissextos como funestos. Três provérbios que recolhi num instantinho confirmam que estamos em ano de pouca sorte:

Colheitas de ano bissexto cabem todas num cesto.
Março de ano bissexto, muita fome e muito mortaço.
Ano bissexto, palha e trigo dentro de um cesto.

Outra curiosidade: mais de 7000 portugueses fazem anos no dia 29 de fevereiro.

Para quem quiser conhecer, com todos os pormenores, a razão de existirem anos bissextos, pode consultar aqui aqui, mais técnico, ou aqui, interativo e mais simplificado.





terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

A pele que há em mim, por Márcia



É uma pequena pérola esta música belíssima, cantada com um intimismo que nos conduz a caminhos de luz e sombra. Há momentos assim, de puro encantamento - momentos que nos transportam para cantos absurdos da nossa sensibilidade e nos enchem a alma de sentido(s).

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Escrever (1)

"Quando penso o que pude escrever ignorando tanto! Mas hoje, que sei um pouco mais, sei apenas o mais que ainda ignoro, e continuo a escrever, porque sei que nunca há tempo para saber, e que afinal não é assim tão importante, desde que, por alguns instantes, tenha sido capaz de pensar, isto é, de entrar no meu corpo de palavras para ser capaz de as mover por dentro e dizer precisamente o que não sei, o que nunca escrevi, tudo o que nunca escrevi, e dizê-lo a alguém, para ti, baixinho, cartas de um jogo perdido, cartas definitivamente por escrever, e o teu nome no fim da página, lugar igual a tantos outros, e, no entanto, neste momento exacto em que o dizes, irrepetível, repito que irrepetível, e apetece chorar."

 Eduardo Prado Coelho, Tudo o que não escrevi, Porto, Edições Asa, 1992, pp.27-28.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Impressões (1)


Tudo  o que sei já lá está, mas não estão os meus passos nem os meus braços.

                                                                                                                                                 António Ramos Rosa

Avisos à navegação

  • Todas as fotografias, salvo expressa indicação em contrário, são minhas.
  • Não gosto do acordo ortográfico, mas se tenho de o usar profissionalmente, não faz sentido andar a ligar e desligar fusíveis. Haverá falhas, bastantes até.

Razões de um blogue

Há uns tempos, comecei a matutar na ideia de ter um blogue. Afinal, gosto de escrever, acredito que não o faço mal e (suprema presunção...) penso que tenho algumas coisas a dizer que podem interessar mais que ao meu umbigo.
O primeiro desafio foi o nome. Ocorreram-me muitos...mas todos ocupados. Foi aí que me apercebi, por um lado, da minha pouca imaginação (mas como é que houve alguém que pensou nisto antes de mim?) e, por outro, da imensidão de cantos e cantinhos nesta blogosfera em língua portuguesa. Muitos encerrados, é certo, outros com meia dúzia de mensagens, mas vivos o suficiente para me impedirem de escolher aquele nome que tão bem condizia com as minhas intenções.
De experiência em experiência, acabei por ser guiada pela poesia de Alexandre O'Neill. Esclareço desde já que será presença assídua neste espaço, pois considero-o, simplesmente (e há muito tempo), um dos maiores poetas portugueses do século XX. Não me consigo lembrar exatamente como o descobri, mas penso que terá sido na adolescência, curiosidade suscitada pelas poesias dispersas que encontrava nos manuais de português. Hei-de falar sobre isto.
Sempre gostei muito do poema que dá título a este blogue. Não sendo um dos mais conhecidos, é para mim um dos mais comoventes - escrito na fase final da vida de O'Neill, é um texto feito de arestas cortantes onde, apesar do cansaço manifestado, não há desesperança nem desistência. É um poema de resistência. Resistir é preciso.
Vivemos tempos difíceis, e repeti-lo seria um lugar comum se não fosse tão verdade. Não é só a crise económica, embora esta tenha o condão de deixar em carne viva o que antes talvez não passasse de um prurido tolerável. É uma crise mais profunda e mais permanente; uma ausência de acreditar, a falência do otimismo. As pessoas olham para o chão; angustiam-se com o presente - acreditam ainda no futuro? Como chegamos aqui? Como vamos avançar de costas para o devir?
O desejo de começar este blogue coincidiu, mais coisa menos coisa, com um período em que senti a minha energia habitual a abandonar-me, ao mesmo tempo que a urgência dos dias me impôs um ritmo inusitado de trabalho, lembrando-me que estava proibida de baixar os braços. Bem, deixo claro que esta é uma característica minha: não baixar os braços, não desistir de um projeto, resistir, nem que seja por teimosia, nem que me esgote no processo.
O blogue nasce agora, no momento certo, depois de meses de hibernação e, repito-o, existe porque resistir é preciso. Contra o cansaço, uma faca. A faca do absurdo.
Pequenos absurdos, portanto. Que podem ser tudo: as viagens, os sonhos, os desejos, os desabafos, os comentários, os sentimentos. A literatura, a poesia, a futilidade, os locais, os projetos, as coisas. As palavras, as imagens, os silêncios. Sinto agora a ansiedade de todas as partidas.

A reter: Um pequeno absurdo às vezes basta para salvar.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Um pequeno absurdo às vezes chega para salvar.

Dai-nos, meu Deus, um pequeno absurdo quotidiano que seja,
que o absurdo, mesmo em pequenas doses,
defende da melancolia e nós somos tão propensos a ela!
Se é verdade o aforismo faca afia faca
(não sabemos falar senão figuradamente
sinal de que somos pouco capazes de abstracção).
Se faca afia faca,
então que a faca do absurdo
venha afiar a faca da nossa embotada vontade,
venha instalar-se sobre a lâmina do inesperado
e o dia-a-dia será nosso e diferente.
Aflições? Teremos muitas não haja dúvida.
Mas tudo será melhor que este dia-a-dia.
Os povos felizes não têm história, diz outro aforismo.
Mas nós não queremos ser um povo feliz.
Para isso bastam os suíços, os suecos, que sei eu?
Bom proveito lhes faça!
Nós queremos a maleita do suíno,
a noiva que vê fugir o noivo,
a mulher que vê fugir o marido,
o órfão que é entregue à caridade pública,
o doente de hospital ainda mais miserável que o hospital
onde está a tremer, a um canto, e ainda ninguém lhe ligou nenhuma.
Nós queremos ser o aleijado nas ruas,
a pedir esmola, a esbardalhar-se frente aos nossos olhos.
Queremos ser o pai desempregado que não sabe que Natal há-de dar aos seus.
Garanti-nos, meu Deus, um pequeno absurdo cada dia,
Um pequeno absurdo às vezes chega para salvar.

Alexandre O'Neill